segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Pedregulhos.

A parede da minha sala é feita com pedras do chão da rua. Duas avenidas e três praças me encaram na vertical, com seus pedaços encaixados, confundindo cola com gravidade. Às vezes me esqueço que é parede e erro o caminho. Ando em direção à porta e, de repente, me encontro no teto. E, então, despenco, sem graça, segurando o cós da calça enquanto vou recolhendo as unhas e dentes que perdi na queda. Por favor, não vá me dizer que eu subi na parede porque quis.

Perdi as profundidades, e a realidade eu comi com pão. Me desequilibro nas pedras, rachadas e mal coladas. Me perco em casa. Enfio o dedo na tomada e tropeço no fio da televisão. Vejo os olhares tortos de quem come com calma na mesa da cozinha. Talvez a casa só esteja rodando em volta de mim (ou talvez eu que esteja rodando em volta da casa). Quero mostrar pra você o que eu vejo agora que meus óculos ficaram presos no lustre. Deixe que eu me explique antes de me mandar descer e esquentar a sopa - esquentar não, ferver - para matar até os últimos resquícios de bactérias e sentimentos e lembranças que ainda me permito guardar.

Fico de olhos fechados, torcendo para que eles não quebrem ao meio como o resto de mim. Talvez não exista mesmo mais o que falar, não agora que percorro tantas ruas entre o chão e o teto, não agora que cavei buracos por toda a cidade para me criar uma parede. Você pode me vendar e contar até dez, me empurrar e segurar os meus pés. Não me importa mais o que faça, comigo ou com as outras pessoas, depois que construí minha parede com pedras de rua, em qualquer lugar que eu esteja, me encontro no chão.

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