quarta-feira, 30 de março de 2011

Larissa Lins.


Olho por aí e vejo tanta gente buscando um amor. Aquele lá que vai salvar a vida, dar um novo significado até para as menores coincidências do mundo. Um amor que vai tirar remela do seu olho pela manhã, comprar um presente no meio da semana sem motivo. Fica todo mundo esperando aquele alguém que vai chegar no escritório, durante o horário de trabalho, só pra dar um beijo.

O amor imaginado tem pequenas brigas, porque sexo de reconciliação é sempre coisa de louco. Tem dias ensolarados na praia e chuvosos no cinema. Tem conversas sobre a relação que realmente levam a mudanças concretas, sem terminar com brigas intermináveis sobre... sobre o que mesmo? No meio dessa caçada à metade, à alma gêmea e outros substantivos bregas, desse tiroteio de intenções desesperadas, o amor de verdade é subestimado. Fica lá no cantinho, enquanto a maioria procura por ele em placas de néon. Amor não é um show da broadway. É cachorro-quente na esquina. É milk-shake com dois canudos. E do outro lado, nem sempre é quem esperamos. E você é a prova disso. O amor é quase uma terceira pessoa entre nós, de tão presente, tão tateável. E como tudo que é real, também trouxe dor. Abrimos grandes feridas, expusemos carne, ossos e nervos. E não eram de aço. Mas até isso serviu pra mostrar que nunca deixou de ser amor. A realidade sempre se manteve sob nossos pés. As amigas inseparáveis, com empregos de usar tailleur, filhos lindos e viagens exóticas eram coisa de filme. Nós ficamos com as quedas em escadas rolantes, os cabelos desajeitados da adolescência, as risadas descontroladas nos lugares mais inapropriados, as descobertas embaraçosas, as vozes engraçadas, as piadas que só nós entendemos. O mundo tem bilhões de pessoas e ninguém, além de nós, vê sentido ou graça nas nossas piadas. Não é lindo isso? Cantamos parabéns mais de 15 vezes, vimos namorados indo e vindo, gatos e cachorros nascendo e morrendo. Falhamos, sentimos o coração se partir com tanta força que chegava a dar um terremoto no corpo todo. Mas nunca deixamos de nos amar, mesmo quando achamos que tudo havia acabado. Já disse eu te amo algumas vezes na vida, mas quando penso em nós duas, questiono alguns amores. Conhecer você fez eu me conhecer melhor. Me sinto acolhida por você, que nem comer broa de milho de avó e dormir em lençol com cheirinho de casa. Você me conforta por existir, mesmo que longe, mesmo que ocupada, compromissada, chateada. Não temos mesmo sangue, nunca fizemos sexo, não dividimos contas. Não quero ter filhos com você, nem esquentar meus pés nos seus. Mas o outro canudinho do milk-shake sempre vai estar lá pra você.

sexta-feira, 25 de março de 2011

Metallica.

Se jogou na cama e fechou os olhos. Era o jeito mais fácil de se isolar do mundo naquele momento. Esticou o braço e alcançou o controle do som às cegas. Já esperava o primeiro acorde do cd do Morphine. Ia chorar muito. Precisava colocar aquele nó pra fora. Mas algo saiu errado. Aquele acorde não era Morphine. Demorou a reconhecer, apesar de tão familiar. Black álbum. Metallica. Era isso. Há quanto tempo não escutava? Imaginou se foi sua colega de apartamento quem colocou o cd lá, porque ela mesma nem lembrava que ele existia.
Pensou em levantar e mudar de música. Afinal, queria chorar. Sentia um cansaço grande e estava disposta a se entregar completamente. Não bastassem aqueles dias intermináveis de chuva, infiltração no banheiro, falta de grana e cabelo totalmente sem corte, tinha ele pra piorar. Por que tinha que ser tudo tão difícil? Mas ali naquela cama, ela não queria pensar nele. Preferia chorar sem motivo aparente, mas pensar nele não. Quando ela chorava, as coisas melhoravam um pouco por dois, três dias.
Mas aí começa Sad but True e ela se desconcentra. O passado rouba a cena e enxuga a lágrima que já ia caindo. A imagem chega a ser engraçada. Ela, com sua camiseta preta, cabelos vermelhos batendo na cintura, unhas pretas, enlouquecendo com o Black Álbum. E mesmo depois de anos sem escutar o disco, ela riu ao perceber que ainda sabia a letra.
Pensou em interromper tudo só pra ligar ele e dizer “você não sabe o que eu tô escutando.” Só freou o movimento porque já sabia o que ele ia dizer. Estaria ocupado trabalhando ou simplesmente fazendo algo mais importante. Tudo era mais importante.
The Unforgiven começou e ela nada de chorar. Lembrou do clipe que amava, dos amigos da adolescência. Planejavam montar uma chapa pro grêmio do colégio, ajudar crianças pobres, abrir uma loja de vinis raros. Dinheiro pra quê? Poderiam viver felizes com o básico, fazendo o que amavam. Ninguém sabia o que era ser adulto ainda.
Sentiu saudade da coragem que tinha, da disposição em fazer diferente. Tinha 16 anos e uma infinidade de anos mais pela frente. Mas por que diabos tinha que achar que agora, aos 32, não havia tempo para mais nada? Que pânico era esse que a congelava e fazia aceitar tanta merda?
Quando Nothing Else Matters já estava na metade ela decidiu que não desapontaria aquela menina de 16 anos. Senão fosse por ela, ali, no presente, seria pelo que ela já imaginou que faria de sua vida. Cansou de agir como adulta, responsável. De se contentar com menos, com panelas ruins que deixam a comida grudar no fundo, com gente mal educada. Ia fazer uma faxina.
Antes que o CD terminasse e levasse o impulso embora, pulou da cama e correu para o telefone. Ligou rápido para ele antes que desistisse. Ele atendeu já advertindo que estava sem tempo.
- É rápido.
- Diga.
- Vai tomar no cu.
E desligou. A atitude, aparentemente imatura, nunca soou tão adulta. Prometeu pra si mesma que não tiraria o CD antes de repetir a dose com seu chefe, com o vizinho de cima e com a caixa grossa da padaria. Não ia mais chorar sozinha pelos problemas dos outros. Três meses depois, guardou o CD, antes que ficasse conhecida como uma louca desbocada. Agora ia entrar em uma nova fase. Não deixaria que nada mais chegasse a ponto de ter que mandar alguém tomar no cu. Mas deixou o CD ali, bem a vista. Nunca se sabe, pensou.

domingo, 20 de março de 2011

"Clack!"

Tenho trabalhado tanto, mas penso sempre em você. Mais de tardezinha que de manhã, mais naqueles dias que parecem poeira assentada aos poucos, e com mais força enquanto a noite avança. Não são pensamentos escuros, embora noturnos. Tão transparentes que até parecem de vidro, vidro tão fino que, quando penso mais forte, parece que vai fazer "clack!" e quebrar em cacos, o pensamento que penso de você. Se não dormisse cedo, nem estivesse quase sempre cansada, acho que esses pensamentos quase doeriam e fariam "clack!" de madrugada e eu me veria catando cacos de vidro entre os lençóis. Brilham, na palma da minha mão. Num deles, tem uma borboleta de asa rasgada. Noutro, um barco confundido com a linha do horizonte, onde também tem uma ilha. Não, não: acho que a ilha mora num caquinho só dela. Noutro, um punhal de jade. Coisas assim, algumas ferem, mesmo essas são sempre bonitas. Parecem filme, livro, quadro. Não doem porque não ameaçam. Nada que eu penso de você ameaça. Durmo cedo, nunca quebra.
Daí penso coisas bobas quando, sentado na janela do ônibus, depois de trabalhar o dia inteiro, encosto a cabeça na vidraça, deixo a paisagem correr, e penso demais em você. Quando não encontro lugar para sentar, o que é mais freqüente, e me deixava irritada, agora não, descobri um jeito engraçado de, mesmo assim, continuar pensando em você. Me seguro naquela barra de ferro, olho através das janelas que, nessa posição, só deixam ver metade do corpo das pessoas pelas calçadas, e procuro nos pés delas aqueles que poderiam ser os seus. E fico tão embalada que chego a me curvar, certo que são mesmo os seus pés parados em alguma parada, alguma esquina.
Boas e bobas, são as coisas todas que penso quando penso em você. Assim: de repente ao dobrar uma esquina dou de cara com você que me prega um susto de mentirinha como aqueles que as crianças pregam uma nas outras. Finjo que me assusto, você me abraça e vamos tomar um sorvete, suco de abacaxi com hortelã ou comer salada de frutas em qualquer lugar. Assim: estou pensando em você e o telefone toca e corta meu pensamento e do outro lado do fio você me diz: estou pensando tanto em você. Digo eu também, mas não sei o que falamos em seguida porque ficamos meio encabulados, a gente tem muito poder de parecer ridículos melosos piegas bregas românticos pueris banais. Mas no que eu penso, penso também que somos mesmo meio tudo isso, não tem jeito, e tudo que vamos dizendo, quando falamos no meu pensamento, é frágil como a voz de Olivia Byington cantando Villa-Lobos.
Tenho trabalhado tanto, por isso mesmo talvez ando pensando assim em você. Brotam espaços azuis quando penso. No meu pensamento, você nunca me critica por eu ser um pouco tola, meio melodramática. E deito a cabeça no seu colo ou você deita a cabeça no meu, tanto faz.
Demora tanto que só depois de passarem três mil dias consigo olhar bem dentro dos seus olhos e é então feito mergulhar numas águas verdes tão cristalinas que têm algas na superfície ressaltadas contra a areia branca do fundo. Aqualouca, encontro pérolas. Sei que é meio idiota, mas gosto de pensar desse jeito, e se estou em pé no ônibus solto um pouco as mãos daquela barra de ferro para meu corpo balançar como se estivesse a bordo de um navio ou de você. Fecho os olhos, faz tanto bem, você não sabe. Suspiro tanto quando penso em você, chorar só choro às vezes, e é tão freqüente. Caminho mais devagar, certo que na próxima esquina, quem sabe. Não tenho tido muito tempo ultimamente mas penso tanto em você que na hora de dormir vez enquando até sorrio e fico passando a ponta do meu dedo no lóbulo da sua orelha e repito repito em voz baixa te amo tanto dorme com os anjos. Mas depois sou eu quem dorme e sonha, sonho com os anjos. Nuvens, espaços azuis, pérolas no fundo do mar. "Clack!" como se fosse verdade, um beijo.

sexta-feira, 18 de março de 2011

Flávio.

Sorrir por outro sorriso é sorrir duas vezes quando aquele sorriso foi uma obra sua. Não me importo com o amanhã, sempre alimento a certeza de que você vai estar ali pra me ajudar, pra me fazer rir, fazer o papel de quem realmente ama o amigo, fazer o papel do amor verdadeiro. E não existe distância quando os laços da amizade são os mais fortes, os que talvez são inquebráveis, e toda essa distância só os fazem fortalecidos, a cada gesto de ternura e afeto. Ter confiança, deixar as notas da melodia seguirem com a letra por si próprias. Isso sim é ser amigo, estar contigo, independente de qualquer coisa. Não quero perder o hoje, pensando no futuro, quero viver o sentimento, porque eu não sei o dia de amanhã, talvez eu não esteja aqui. Por isso, digo que te amo, com todas as letras, com todos os significados que essa palavra exerce. Obrigado por existir, e por fazer parte da minha vida, parte do meu dia, e parte do meu ser.

sábado, 12 de março de 2011

@naosinto

É como se toda a capacidade de sentir estivesse aqui, bem no fundo de mim. Só que pra conseguir tocá-la seria preciso cavar. Mas minha superfície ao longo do tempo tornou-se tão dura, sabe? Dizem que viver é sentir. E talvez seja, já que eu sinto fome, eu sinto sono, eu sinto vontade de fazer xixi. Isso é apenas a minha superfície. Parece que o meu interno se perdeu, junto dele, meus sentimentos também se foram. Onde estão? Eu sinto falta deles. Eu sinto tanta falta. Parece que ainda sinto alguma coisa. Mas que grande coisa, não?