A manhã se refresca com a minha rigidez.
Amanhã, com sorte, o cimento já não vai mais estar tão fresco, vai ser mais
fácil levantar, vai ser melhor, isto é, se amanhã conseguir evitar o desprazer
de vir a existir. O amanhã era muito mais agradável ontem, você vai ter que
concordar, quando a gente sabia que ele não existia, quando ele parecia somente
mais uma brincadeira da nossa doença, quando o corpo já estava mais curto e
macio pelo fim do dia. O amanhã está calcificado na sua presença de hoje, faz
uma vértebra consolidar-se na outra para impedir o movimento, impedir que eu
caminhe até o dia seguinte, não precisava de ajuda, eu já me arrasto para
longe.
Sei que você reserva o futuro especialmente para a morte, está certo, é à ela
mesmo que ele pertence, nós temos ainda esses fantasmas de nós mesmos e os
glicocorticóides, não precisamos de futuro.
Minha inflexibilidade cresce assimétrica.
O amanhã existe cada vez menos conforme a fusão do nosso eixo axial se torna
completa, mas que sorte a nossa.
Minha rigidez se renova pela manhã.